Quarta-feira, 24 de Fevereiro de 2010
SER SÁBIO PARA ENVELHECER COM SABEDORIA

 

Por onde andaram os dos anos 60?
 
            No encontro da Buraca, o meu amigo José Duque voltou a fazer-me, pela terceira vez, a pergunta: «por onde andaram -- até agora, subentendo eu -- os ex alunos dos anos 60? Vou enfrentar a pergunta de peito feito e aberto e tentar responder-lhe. Já antes tinha tido o grato prazer de cavaquear numa longa/curta tarde, no Sardoal, com o José e o António Duque na companhia do José Mora Alves. Verifiquei que o José Duque continuava a ter o coração próximo da boca enquanto o mano António se resguardava mais na sua calma e fleuma. Há poucas hipóteses de errar se disser que, em Alcains, o Monsenhor José Maria Félix considerou o primeiro primário e o segundo secundário quando estudou os seus temperamentos. (Lembram-se dos questionários para determinar o nosso temperamento? Os santos e cientistas que nos poderiam servir de exemplo, os aspectos positivos e os que era necessário combater, a hierarquia dos temperamentos, etc. Talvez um dia volte a este aspecto.)
            Voltemos à pergunta do José Duque.
1. Admitindo que não há nenhuma ponta de ironia, nenhuma pitada de provocação ou nesga de insinuação na pergunta, respondendo santanisticamente, diria: andámos por aí a tratar da vida. Quase sempre numa lufa, lufa e com pouco tempo para nos ocuparmos de coisas de somenos importância como foi a passagem, para muitos por imposição e a contragosto, pelo seminário. As urgentes tarefas do presente não permitiam o luxo de nos preocuparmos com um passado longínquo.
2. Só que a pergunta do José Duque é paradoxal, senão impossível. Se o tempo e a idade ainda continuam a ser o que eram, em que anos é que o José Duque frequentou o seminário de Alcains? Será que, qual Descartes de trazer por casa, passei o tempo todo a sonhar enquanto o tive como colega em Alcains? Terá o José um duplo ou será o primeiro exemplar concreto da metempsicose? É que o José Duque, ao fazer a pergunta, exclui-se dos anos 60 quando efectivamente ele consta dos registos e listas religiosamente actualizadas e guardados do J. Peres.
3. A pergunta do José Duque é tão interessante pelo que mostra como pelo que oculta. Mostra que o José Duque é doutro tempo. Ou seja, ao entrar e ter contribuído para os encontros da Buraca desde muito cedo deixou-se contaminar pelo tempo, diria o filósofo católico Jean Guiton. É verdade que sempre foi encontrando honrosas e resistentes excepções dos anos 60 (Salve, Manteigas!), mas viu sempre afastar os que do seu tempo se foram aproximando… A título de hipótese, admito que o José Duque, num qualquer sentido, passasse a ser uma pessoa doutro tempo. Vamos ao que a pergunta oculta: apareceram por aí uns atrevidotes, pseudo-revolucionários, que julgam ter descoberto a pólvora, um tal Colaço, Peres, Silvério e outros, possuidores de uma entusiasmo infantil, que nunca apareceram, … a querer realizar encontros e dinamizar a associação dos antigos alunos da diocese de Portalegre e Castelo Branco, mas por onde andaram eles agora? Armaram-se de telemóveis, computadores, redes sociais, blogs e outras modernices e querem fazer frente à velha máquina de escrever, aos envelopes e selos do «veterano patriarca» Heitor… Talvez venham por lã e volvam tosquiados…
4. Telegraficamente a pergunta transforma-se: Por que não têm aparecido na Buraca? Há inúmeras respostas possíveis. Vou elencar apenas algumas hipóteses.
Hipótese.1: Faço minhas as palavras de alguém que, ontem, no blog, dizia que aqueles encontros não lhe diziam nada e, portanto, os poucos dos anos 60 que iam aparecendo, pelas mais diversas razões não se sentiam atraídos para voltar.
Hipótese.2: muitos dos ex-alunos dos anos 60 nunca souberam da existência dos encontros e da associação. Hipótese muito plausível e sustentável dada a pouca organização e comunicação. Atenção que o reconhecimento destes factos não belisca em nada o trabalho e a boa vontade de quem manteve acesa a chama!...
Hipótese.3: Surrealista e luso-socrática: confundiram a Buraca com um buraco. O que se passa num buraco não tem visibilidade devido à ausência da Luz. Daí não se segue que o que não se vê não exista… [Esta hipótese é só para testar ( atenção, Colaço!) e ver se há liberdade de expressão cá pelo burgo].
Hipótese.4: a associação dos antigos alunos tornou-se prisioneira da geração inicial e não soube, não pode ou não a deixaram integrar as diferentes gerações de ex-seminaristas.
5. A minha hipótese.5 é também a minha resposta pessoal. A vida tem fases ou, como diria o psicólogo e psicanalista Erik Erikson, idades e cada idade vive uma crise. Muitos de nós vivemos uma das crises mais importantes da vida no seminário, a da adolescência. É a crise da identidade versus dissolução. A superação desta crise permite-nos saber o que queremos ser, construir a nossa identidade sexual, fazer projectos de vida, etc., e na sua vivência têm um papel essencial as experiências e as amizades. Agora que os dos anos 60 se aproximam dos 60 anos de idade, vivem uma outra crise – integridade versus desespero -- que urge ultrapassar. Creio que é natural que nós queiramos integrar todos os momentos da nossa vida. Do sucesso dessa integração, sobretudo de momentos tão marcantes como os da adolescência depende a sabedoria com que encararemos a nossa velhice. Ser sábio, neste contexto, é integrar todas as vivências ao longo da vida, assumi-las, relativizá-las, rir-se delas e, por fim, fazer um balanço positivo: valeu a pena!
 A alternativa não é entusiasmante: não integrar as suas vivências é transformar-se num velho, rezingão, ressabiado com tudo e com todos, que só sabe dizer mal, etc. Gostaria que cada um de nós pudesse viver a sua velhice com sabedoria. Estamos no tempo de a começar a integrar para a construir.
6. Com uma especial saudação para os manos Duques, ocasião para esta prosa, concluo:
(a) Eu precisei, e creio que outros também precisam, de integrar a passagem pelo seminário na história da minha vida;
(b) A passagem pelo seminário precisa de ser integrada, mas isso nada diz sobre o seu lugar, importância, valoração, etc. Isso é trabalho de cada um;
(c) O facto de se ir aos encontros já significa a atribuição de alguma importância à passagem pelo seminário: vai-se para encontrar algo;
(d) Sair dos encontros e dizer que não lhe dizem nada é, no mínimo, um desabafo e um desafio: como organizá-los para que se tornem significativamente mais ricos para todos?
            Espero reencontrar o António e o Zé Duque, entre muitos outros, em Alcains. Já agora conhecer o Arménio Duque e muitos outros!
 
Mário Pissarra 
 
NR
1.Meu caro Mário, tal como pediste, na edição, acrescentei alguns sublinhados e permiti-me chamar a título a sabedoria para que nos convocas.
 
2.Não quero monopolizar o que quer que seja, mas quero reivindicar, deste texto, não a sua autoria mas a pequena velhacaria de te obrigar a pensar para nós! Eu sabia que o meu silêncio de ontem, e a chamada de atenção para o  texto daquele amigo que o João me fez atravessar no caminho, só podiam terminar neste chão de pepitas que agora nos cabe escavar.
É um privilégio saber-te em forma. Assim, vai ser mais fácil envelhecer. Envelhecer com sabedoria. Vou voltar noutro dia!
Obrigado Mário!
PS
Espero que percebas porque editei a foto do teu primeiro dia de ...reformado! Foi aí que te conquistámos e descobrimos que, afinal,agora, sim, é que estás em (re)forma!!!!
antónio colaço
 
 
 
 

 



publicado por animo às 19:56
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