A política. A administração.
O papa vem a Fátima e Fátima prepara-se para recebê-lo. É normal. Essa preparação está a ser feita pelo Santuário e pelas ordens religiosas ali estabelecidas, pelos comerciantes e hoteleiros, e também pela Câmara Municipal. Como seria de esperar.
Não foi, por isso, motivo de espanto que, há dias, a televisão fosse ter com o vereador do pelouro de Fátima na Câmara de Ourém saber do andamento dos trabalhos.
Mas foi sintomático que o referido vereador nos tivesse dito, textualmente: “Pedimos a colaboração a toda a população” para embelezar Fátima. E terminou a “apelar a toda a população a que nos possa ajudar” nessa tarefa.
À primeira vista, nada de anormal. E o pior é isso mesmo, já não estranhamos.
Mas se repararmos no jogo das palavras, percebemos o jogo político que elas mostram. O vereador estabelece uma clara distinção entre nós, a Câmara, e vocês, a população. E coloca estes dois campos, na melhor das hipóteses, lado a lado, em “colaboração”.
Contudo, “o bom líder é aquele que vai à frente com uma bandeira”. E teria sido muito fácil, no momento, o líder colocar-se à frente de todos quantos, por motivos religiosos ou económicos, querem receber bem o papa e todos os que ele vai atrair. Mas não. Ele coloca-se, não do mesmo lado e à frente de todos para uma vitória comum, mas ao lado, a pedir a todos “os outros” que o ajudem. Se neste momento de fácil unidade, esta é desfeita, como será nos momentos de conflito?
Fez-me lembrar o discurso que diz, por exemplo, “o Governo baixou o deficit”, o Governo fez e aconteceu. O Governo? E nós?
Creio que os nossos políticos ainda não perceberam o erro essencial desta sua posição. A linguagem que usam denota que tomaram o nosso poder nas suas mãos e claramente nos excluíram dele. Eles são outros, e não os de nós que vão à frente e nos ajudam a caminhar para a nossa vitória. Por isso, a vitória, se a houver, será deles muito mais que nossa. Na melhor das hipóteses, colocam-se na posição de um prestador de serviços. Mas ninguém morre de amores por um prestador de serviços.
A política não se confunde com a administração. Embora, em Portugal, a função política seja acumulada com a de administração da coisa pública. Não tem de ser assim, mas é, e não há nisso mal de maior. Mas administrar é gerir a máquina social, é mantê-la em funcionamento e orientá-la para objectivos definidos. A política é outra coisa, é a definição desses objectivos, é o desenho de um futuro colectivo e é fazer com que a administração caminhe para lá. Por isso não há mal por política e administração estarem em comum. Mas é mal se a política tende a reduzir-se à administração. E é isso mesmo que a linguagem parece mostrar.
Também é verdade que, simetricamente, os cidadãos se colocam do “outro lado” face aos políticos. Mas têm de ser estes, os políticos, a mostrar que estão do mesmo lado e à frente de todos, ou pelo menos de uma parte substancial. E a melhor forma de o mostrar é as palavras serem de liderança e os cidadãos reconhecerem-se nos resultados dessa liderança. É esse o verdadeiro trabalho de dignificação da política.
Alves Jana
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